Segue abaixo a entrevista que dei para a publicação anual americana Cinéwomen que neste ano homenageia as mulheres no cinema.
O artigo em português:
Com coragem e
sensibilidade, Chrys Rochat cria uma mistura radical de técnicas dramáticas e
de documentário: 6 Dias em Chubut é um trabalho de cinema aventureiro e uma
jornada emocionalmente penetrante. Temos o prazer de apresentar Chrys Rochat na
edição deste ano do CinéWomen Edition.
CW. Chrys, fale-nos de sua
trajetória como cineasta e cinematógrafa. O que a inspirou a se expressar
através desse meio?
CR. Eu comecei na indústria
como atriz em Los Angeles, onde eu morei em torno de 8 anos, mas escrever tem sido
uma parte muito importante de meu desenvolvimento como artista. Gosto de
expressar minhas ideias à minha maneira, além disso, sou leonina, portanto, gosto
de mandar nas pessoas, com tudo isso, eu tinha de ser diretora! (Risos) Então,
eu estudei roteiro, direção e edição em Los Angeles e posteriormente, fotografia
para cinema na República Dominicana onde eu também morei por um ano.
CW. Em 2012, você abriu a
sua produtora Sin Fronteras Filmes no Rio. Pode contar aos nossos leitores
sobre essa experiência incrível?
CR. Eu sou nômade. Desde os
18 anos, vivi entre os Estados Unidos, a Europa, a América Latina e viajei por
mais de 23 países, não como turista, mas realmente passando tempo e tentando
conhecer essas culturas. Passei um mês inteiro viajando por todo o Marrocos e
já estive até na Islândia. Digo, quem vai para a Islândia? Brincadeira, é um
lugar fantástico. Então, quando eu voltei ao Brasil em 2012, senti a
necessidade de me instalar um pouco para fazer coisas maiores e eu decido abrir
a minha própria produtora para me concentrar em fazer cinema aqui. Escolhi esse
nome “Sin Fronteras”, porque eu sempre serei “Sem Fronteiras” e eu quero fazer
filmes para o mundo.
CW. Como você teve a ideia
de 6 Dias em Chubut?
CR. Bem, essa é uma
história engraçada. Uma tarde em agosto, Didier me liga do Skype de Genebra na
Suíça dizendo que estava no aeroporto e estava vindo para a Patagônia na
Argentina filmar as baleias para um documentário que seu amigo Thomas Fuss estava
fazendo e que se eu quisesse ver as baleias, essa era a minha chance. Então, na
manhã seguinte, eu peguei um avião e fui encontrar os rapazes em Buenos Aires, para
que pudéssemos ir para a Patagônia para nossa expedição. Sempre foi o meu sonho
de ir à Patagônia e isso era apenas 3 dias antes do meu aniversário. Na verdade,
isso era logo antes da Copa do Mundo e eu devia ir filmar com uma equipe alemã
no Paraguai, para entrevistar o time de futebol paraguaio e para mim não havia
dúvidas, eu simplesmente chutei o trabalho alemão e segui para a Patagônia para
uma aventura muito mais empolgante. Afinal, quando você tem de decidir entre o
time de futebol paraguaio e as baleias da Patagônia para o seu aniversário, o
que mais você pode escolher?
CW. Pode falar sobre o seu
relacionamento criativo com Didier Noirot e como o trabalho de vocês evoluiu?
CR. Didier é um
profissional espetacular. Ele é um mergulhador e cinegrafista marinho tão
talentoso. Ele ganhou um Emmy pelo seu trabalho e eu fiquei muito impressionada
em como ele é capaz de filmar a vida selvagem debaixo d’água. Eu trabalho
bastante para o Discovery Channel, traduzindo, legendando, dublando e dirigindo
dublagens. eu já trabalhei em mais de mil filmes e séries para o mercado
nacional. Didier era o astro de uma das séries que eu traduzi para o Animal
Planet, então, nós nos conhecemos e decidimos que íamos desenvolver um projeto
para rodar no Brasil sobre a vida selvagem nos mares e rios de todo o país. Ele
é tão focado e tão corajoso. Tenho tanta sorte de ter a oportunidade de ver o
trabalho dele de perto e também de ter conhecido Thom e de ver o belo trabalho
que ele também estava fazendo. Foi engraçado ser a única garota numa equipe
predominantemente masculina. No início, todos eles pensavam que eu ia ficar de
“mimimi” ou reclamar, mas eu surpreendi a todos eles! Hahaha
CW. Humor sutil e cinematografia
expressiva tornam 6 Dias em Chubut uma experiência que te transporta. Como você
desenvolveu o seu estilo de filmar?
CR. Olha, eu sou brasileira,
não dá para tirar humor e a sagacidade de nós. Eu devo dizer que a experiência
de 6 Dias em Chubut foi a mais natural, espontânea e profunda que eu já tive em
filmar, simplesmente porque nada era planejado. Nada podia ser planejado, porque
a natureza é alago que simplesmente acontece. Você não pode dar a deixa de
quando a baleia vai aparecer, você não pode controlar o clima ou o movimento do
barco, então, era uma absoluta surpresa a cada minuto. Eu me apaixonei pelas
baleias, toda a surpresa que você vê na tela é autêntica, é viva. Ver a
natureza em todo o seu poder nos dá a verdadeira noção de nossa insignificância
e de ter consciência de que você é apenas um humano diante de coisas tão
maiores que você e também de ver que com todo o seu tamanho elas podem ser tão
dóceis e atenciosas com você. Elas te sentem, elas olham nos seus olhos, elas
entendem que você é um humano e que elas são baleias imensas e que elas tem de
ser gentis com você, porque você é frágil em relação a ela e isso é
simplesmente incrível. E como cineasta, eu apenas tentei capturar trechos do
que eu vivi e senti estando lá e é por isso que esse filme é um documentário do
meu ponto de vista da expedição. Não poderia ser de outra forma.
CW. Desde a primeira vez
que vimos o seu documentário, pensamos no cinema de Werner Herzog. Pode nos
dizer quais são as suas maiores influências no cinema?
CR. Oh meu deus! É uma
honra imensa ser comparada a um diretor tão importante quanto Herzog, não faço
ideia do que eu fiz para merecer isso. Bem, eu admiro muitos diretores como o
próprio Herzog, Wim Wenders, Costa Gavras, Ken Loach, e também caras mais
jovens como Thomas Vinterberg, cujo “Festa de Família” foi muito importante
para mim, quando fiz o meu primeiro filme em Los Angeles e vi a oportunidade de
usar o digital para expressar uma ideia
forte. Mas também sou muito influenciada pelo cinema francês, porque o meu
grande mestre foi o meu próprio marido, Eric Rochat, que era um diretor
francês e fez muitos filmes, incluindo “O Quinto Macaco” com Ben Kingsley e a
trilogia de “História de O”. Como eu morei na França por 6 anos, e tive a
oportunidade de ver muitos trabalhos de Truffaut, Goddard e outros diretores
franceses, e eu adoro a atmosfera intimista, a profundidade das tramas e as
sutilezas do humor francês. Eu não poderia enumerar todos os filmes e diretores
que eu gosto, mas como a minha maior escola foi Los Angeles, eu não poderia
deixar de mencionar Hitchcock, Orson Welles e David Lynch, que eu sou muito
ligada. Ainda estou procurando o meu próprio jogo, mas tenho grandes caras para
me inspirar.
CW. O que foi o mais
desafiador na execução desse filme?
CR. Acho que o frio, foi a
coisa mais desafiadora para mim. Ir de 35°C no Rio de Janeiro para 2°C de
ventos polares na Patagônia foi bem duro. Houve um momento em que eu pensei
comigo mesma: “Que diabos eu estou fazendo aqui? Se eu não posso suportar o
vento lá fora por 2 minutos, como é que vou conseguir ir num barco em mar
aberto por 6 horas?” Acho que tudo compensou no final, porque hoje o filme já
esteve em dois festivais no Brasil: Festival Internacional de Televisão e X FATU
em 2014, e agora em Setembro de 2015, ele vai para o Handle Climate Film
Festival em Shenzhen na China, Voices From the Water em Bangalore e o 3rd
Indian Cine Film Festival em Mumbai, ambos na Índia.
CW. Por mais de meio
século, mulheres têm sido desencorajadas de estar por trás das cameras, contudo,
nas últimas décadas há sinais de que isso está mudando. Qual é a sua visão do
futuro da mulher no cinema?
CR. Eu acho que as mulheres
foram desencorajadas de muitas coisas no passado e ainda são hoje, mas isso não
nos impede de fazer o que realmente queremos. Eu não penso como uma mulher, eu
penso como um ser humano. Eu não acredito que intelecto, talento ou
determinação são ditados por gênero. Então, basicamente, eu acho que posso
fazer qualquer coisa que eu decidir que vou fazer. Nesse filme em particular,
durante a produção, eu estava cercada de homens e correu tudo muito bem, e
quando eu voltei da expedição e comecei a fase de pós-produção, eu só tinha
mulheres ao meu redor, como a minha produtora executiva e sócia nesse projeto,
Vanessa Fontana, que abraçou a ideia, acreditou em mim e tornou a conclusão
desse filme possível. E também Aglay Bond, minha advogada e Andrea Richa, minha
melhor amiga, cujo feedback e apoio foram muito apreciados quando eu estava editando.
Todas elas me ouviam descrevendo em detalhes, por horas a fio, como eu me
apaixonei por uma baleia franca austral. É assim que as mulheres fazem filmes.
:P
CW. Obrigado pelo seu tempo
e pensamentos, Chrys Rochat. Nós te desejamos tudo de melhor na sua carreira. O
que vem a seguir para você? Tem algum projeto em particular em mente?
CR. Sim, estou muito
empolgada com o filme que estou produzindo e que vou dirigir ano que vem. É um
roteiro original meu: “Renomada escritora
de mistérios, atormentada por um bloqueio criativo, acredita ter visto um crime e agora quer
desvendá- lo, mas acaba correndo perigo real, ao cair no intrincado submundo do
tráfico de animais da Amazônia. Pressionada a escrever um novo livro, ela usa a
morte de uma jovem índia como ponto central da trama, mas cai num dilema
terrível: O crime realmente aconteceu ou é só fruto de sua mente obcecada por
uma nova ideia? Logo, o que viu e o que escreve se misturam e já nem ela é
capaz de distinguir a realidade da ficção.” Tenho um elenco muito importante
no Brasil como Camila Morgado (Olga), a escritora, Eunice Baía (Tainá), a jovem índia,
André Ramiro (Tropa de Elite), o investigador, entre outros e a distribuição é
da Europa Filmes.